Estabilidade x mudança de estratégia: como Sebastião Melo e Maria do Rosário chegam ao segundo turno em Porto Alegre
Sebastião Melo e Maria do Rosário protagonizam a disputa em Porto Alegre, no domingo (27). Jefferson Botega/Arte GZH / Agencia RBS
Sebastião Melo (MDB) e Maria do Rosário (PT) disputam, no domingo (27), o segundo turno das eleições para a prefeitura de Porto Alegre.
Na primeira etapa do pleito, o emedebista conquistou 49,72% dos votos válidos. A 1,9 mil votos de vencer na primeira rodada, coube à equipe de campanha manter o foco e o ritmo nas agendas do candidato à reeleição, que investiu no corpo a corpo com a população e com o empresariado, e ampliou o arranjo político, garantindo reaproximação com Eduardo Leite e Gabriel Souza.
Rosário, precisando virar a eleição após obter 26,28% dos votos, imprimiu um novo ritmo à campanha, mirando mais no que considera fragilidades do seu adversário e menos na enchente e em sua imagem pessoal, fortemente presentes no primeiro turno. Mapeou territórios com votação mais expressiva do PT nas últimas eleições, buscando atrair quem votou no presidente Lula, no ex-governador Olívio Dutra e no ex-deputado Edegar Pretto em 2022.
Veja, a seguir, o que foi mantido, alterado ou incorporado nas rotas dos dois postulantes ao Paço Municipal rumo ao comando da prefeitura da capital pelos próximos quatro anos.
Estabilidade é uma definição adequada para o segundo turno do prefeito e candidato à reeleição Sebastião Melo (MDB). Na primeira etapa da disputa pela prefeitura de Porto Alegre, Melo conquistou 49,72% dos votos válidos. Faltaram cerca de 1,9 mil votos, num universo de 694,6 mil eleitores que escolheram um candidato, para vencer na primeira rodada. A proximidade do triunfo poderia causar relaxamento, mas Melo vacinou a equipe desde o início. Exigiu foco e manteve ritmo nas agendas de campanha, fazendo caminhadas em bairros e regiões de comércio, desde o Sarandi até o Centro Histórico e Ipanema.
Também percorreu zonas populosas empoleirado na caçamba de uma caminhonete. No segundo turno, uma das apostas foi colocar Melo em semáforos de forte circulação, onde surpreendia motoristas ao fazer corpo a corpo. Tudo intercalado com uma agenda recheada de entrevistas a meios de comunicação e gravações em praças para os programas da propaganda eleitoral. A avaliação da campanha é de que não houve, na etapa final da disputa com Maria do Rosário (PT), nenhum fato novo que pudesse acender alerta de reviravolta.
— O exemplo arrasta. Se o líder está mobilizado indo para os semáforos, é um símbolo para a militância de que ela precisa estar junto — afirma André Coronel, coordenador-geral de campanha.
Outro aspecto que manteve a caminhada sólida foi o alargamento do arranjo político. Oito partidos o apoiam desde o princípio, mas, no segundo turno, o prefeito conseguiu se reaproximar do governador Eduardo Leite (PSDB) e do vice-governador Gabriel Souza (MDB). Ambos declararam apoio a Melo, com quem tinham relação tensa e distante desde a eleição de 2022. Naquela ocasião, Melo se arriscou ao fazer campanha para Onyx Lonrezoni (PL) na disputa pelo Palácio Piratini, indo contra a candidatura do seu partido, o MDB, que tinha indicado o vice de Leite.
Agora, com arestas aparadas, houve gestos públicos de reconciliação. Sobretudo a pacificação com Leite é agregadora: o tucano fez quase 70% dos votos na Capital no segundo turno de 2022.
— Todos os apoios são importantes, mas esses (Leite e Gabriel) zeraram um assunto que não estava totalmente resolvido politicamente — reconhece Coronel.
Melo recebeu o esperado endosso de Felipe Camozzato (Novo), que anotou 3,83% dos votos válidos no primeiro turno. O PDT de Juliana Brizola declarou apoio a Rosário, fruto de uma orientação nacional, mas o partido está rachado. Parte das lideranças locais trabalha por Melo. Mesmo no PSB, coligado com Rosário, há dissidências em direção ao prefeito: uma delas é do vereador Airto Ferronato, que publicou vídeo demarcando posição.
No segundo turno, Melo fez uma pausa na estratégia de equidistância do bolsonarismo radical, já que tem esse voto cristalizado, para participar de um ato público com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Ainda no campo das alianças, recebeu apoio de 18 prefeitos da Região Metropolitana, entre atuais mandatários e eleitos. São atos que reforçam o slogan de Melo, o de fazer “juntos”, tentando empurrar para o PT a pecha da dificuldade de se relacionar com o conjunto da sociedade.
Tensa, a cúpula do PT acompanhava a apuração no segundo andar do comitê central de Maria do Rosário quando, na rua, a militância explodiu em êxtase. Eram 19h12min de 6 de outubro e o nervosismo que acompanhou os petistas desde o começo do escrutínio havia sido superado: por escassos 1.945 votos, Sebastião Melo (MDB) não liquidou a eleição no primeiro turno e Rosário teria pela frente um novo confronto com o atual prefeito.
Precisando virar a eleição após obter 26,28% dos votos ante 49,72% de Melo, Rosário imprimiu um novo ritmo à campanha. A candidata nem sequer havia discursado no comício que festejava a ida ao segundo turno e seus estrategistas já concebiam o teor das propagandas.
A ênfase aos alagamentos ocorridos durante a enchente de maio cedeu lugar às denúncias de corrupção na prefeitura. As propostas para saúde, educação e assistência social, apresentadas de forma genérica no primeiro turno, ganharam rosto e voz, com depoimentos da população.
— No primeiro turno, a gente precisava ser a melhor oposição ao Melo. No segundo, precisamos oferecer um futuro melhor — resume o marqueteiro da campanha, Halley Arrais.
Com o mesmo tempo de rádio e TV de Melo, a ideia de Arrais foi usar os cinco minutos de blocos diários para humanizar a propaganda, enquanto as 25 inserções de 30 segundos centrariam foco nas críticas. Dessa forma, Rosário surgiu como a mulher que chamava pelo nome as pessoas que sofriam na fila por atendimento de saúde, por exemplo, enquanto atores denunciavam supostas irregularidades na Secretaria de Educação (Smed), no Hospital da Restinga e no Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae).
A partir de um reforço de oito roteiristas que haviam participado de campanhas aliadas em Campinas (SP) e Belo Horizonte (MG), as peças ganharam humor e ironia, seja para cobrar promessas não cumpridas por Melo ou ressaltar sua relação com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A nova estratégia pacificou o comando de campanha.
No primeiro turno, havia um incômodo em alguns setores da coligação diante da frequência quase diária com que os comerciais exibiam Rosário como professora cristã e parlamentar experiente. Concebidas para suavizar a imagem da candidata, as peças sumiram no segundo turno, por entendimento de que era preciso diminuir a preocupação com a rejeição de Rosário e focar no que o comitê considerava fragilidades de Melo. Dessa forma, ganharam tração temas de apelo popular, como a apreensão de uma Ferrari e a acusação de compra de um apartamento com dinheiro vivo no escândalo da Smed.
GZH